sábado, 3 de abril de 2010

[PGN] Redes: o que são redes?


Texto de Apoio: Tipologia das Redes 3

O que são redes?
O conceito de rede transformou-se, nas últimas duas décadas, em uma alternativa prática de organização, possibilitando processos capazes de responder às demandas de flexibilidade, conectividade e descentralização das esferas contemporâneas de atuação e articulação social.
A palavra rede é bem antiga e vem do latim retis, significando entrelaçamento de fios com aberturas regulares que formam uma espécie de tecido. A partir da noção de entrelaçamento, malha e estrutura reticulada, a palavra rede foi ganhando novos significados ao longo dos tempos, passando a ser empregada em diferentes situações.
A organização em rede enquanto fato histórico existe há bastante tempo. Citamos dois exemplos de articulação solidária ou organização em rede historicamente inquestionáveis: na idade Média, quando uma estrutura feudal dividia a sociedade em 3 ordens absolutamente hierarquizadas, o povo se organizava em "laços de solidariedade horizontal". E a articulação de judeus do mundo todo para salvar os compatriotas condenados aos campos de concentração na Europa? Trata-se de um exemplo de iniciativa em rede que simplesmente salvou milhares de pessoas do holocausto.
Mas a conceituação de Rede enquanto sistema de laços realimentados provém da Biologia. Quando os ecologistas das décadas de 1920 e 1930 estudavam as teias alimentares e os ciclos da vida, propuseram que a rede é o único padrão de organização comum a todos os sitemas vivos: "Sempre que olhamos para a vida, olhamos para redes." (Capra, 1996)
A temática das redes não é uma novidade no campo acadêmico. A Biologia e a Física têm apresentado discussões sobre o tema há bastante tempo e as apresentações descritivas não diferem tanto das que temos utilizado, exceto pelas equações matemáticas que empregam em sua linguagem. No entanto, interessa observar a coincidência histórico-conceitual entre o advento do terceiro setor e a utilização intelectual e a própria prática do trabalho em rede. Terceiro Setor e Redes são hoje realidades intrinsecamente relacionadas. O terceiro setor é, essencialmente, uma rede e aqui podemos imaginar uma grande teia de inter-conexões.
Redes de Educação Ambiental, redes emissoras de TV e rádio, redes de lideranças, rede de trabalho e renda... Por mais diversas que sejam as organizações e suas causas, elas têm em comum o propósito de estender suas ações e idéias a um universo sempre mais amplo de interlocutores: beneficiários, parceiros, financiadores, voluntários, colaboradores, etc. Para isso, precisam contar com meios adequados para o desenvolvimento de fluxos de informação, gerenciamento organizacional e comunicação institucional.
O terceiro setor se caracteriza por iniciativas, cujos profissionais envolvidos percebem a colaboração participativa como um meio eficaz de realizar transformações sociais. As instituições do terceiro setor têm procurado desenvolver ações conjuntas, operando nos níveis local, regional, nacional e internacional, contribuindo para uma sociedade mais justa e democrática. Para tanto, e a partir de diversas causas, a sociedade civil se organiza em redes para a troca de informações, a articulação institucional e política e para a implementação de projetos comuns. As experiências têm demonstrado as vantagens e os resultados de ações articuladas e projetos desenvolvidos em parceria.


Redes são sistemas organizacionais capazes de reunir indivíduos e instituições, de forma democrática e participativa, em torno de objetivos e/ou temáticas comuns.
Estruturas flexíveis e cadenciadas, as redes se estabelecem por relações horizontais, interconexas e em dinâmicas que supõem o trabalho colaborativo e participativo. As redes se sustentam pela vontade e afinidade de seus integrantes, caracterizando-se como um significativo recurso organizacional, tanto para as relações pessoais quanto para a estruturação social.
Na prática, redes são comunidades, virtual ou presencialmente constituídas. Essa identificação é muito importante para a compreensão conceitual. As definições de Rede falam de células, nós, conexões orgânicas, sistemas... tudo isso é essencial e até mesmo historicamente correto para a conteituação, mas é a idéia de comunidade que permite a problematização do tema e, conseqüentemente, o seu entendimento.
Uma comunidade é uma estrutura social estabelecida de forma orgânica, ou seja, se constitui a partir de dinâmicas coletivas e historicamente únicas. Sua própria história e sua cultura definem uma identidade comunitária. Esse reconhecimento deve ser coletivo e será fundamental para os sentidos de pertencimento dos seus cidadãos e desenvolvimento comunitário.
A convivência entre os integrantes de uma comunidade, inclusive o estabelecimento de laços de afinidade, será definida a partir de pactos sociais ou padrões de relacionamento.
Essa analogia conceitual se desdobra em algumas considerações que merecem pontuações.


Fundamentos e paradigmas das Redes
Uma atuação em rede supõe valores e a declaração dos propósitos do coletivo (missão): por que, para que e fundamentada em quê a rede existe? Há alguns parâmetros que norteiam a interação e devem ser considerados por quem queira trabalhar colaborativamente; uma espécie de código de conduta para a atuação em rede:
Pactos e Padrões de Rede: sem intencionalidade uma rede não consegue ser um sistema vivo, mas apenas um amontoado de possibilidades (intencionalidade aqui não possui um sentido teleológico, muito pelo contrário, mas significa a declaração de suas intenções de rede). A comunicação e a interatividade se desenvolvem a partir dos pactos e dos padrões estabelecidos em comunidade. Uma rede é uma comunidade e, como tal, pressupõe identidades e padrões a serem acordados pelo coletivo responsável. É a própria rede que vai gerar os padrões a partir dos quais os envolvidos deverão conviver. É a história da comunidade e seus contratos sociais.
Valores e objetivos compartilhados: O que une os diferentes membros de uma rede é o conjunto de valores e objetivos que eles estabelecem como comuns, interconectando ações e projetos.
Participação: A participação dos integrantes de uma rede é que a faz funcionar. Uma rede só existe quando em movimento. Sem participação, deixa de existir. Ninguém é obrigado a entrar ou permanecer numa rede. O alicerce da rede é a vontade de seus integrantes.
Colaboração: a colaboração entre os integrantes deve ser uma premissa do trabalho. A participação deve ser colaborativa!
Multiliderança e horizontalidade: Uma rede não possui hierarquia nem chefe. A liderança provém de muitas fontes. As decisões também são compartilhadas.
Conectividade: Uma rede é uma costura dinâmica de muitos pontos. Só quando estão ligados uns aos outros e interagindo é que indivíduos e organizações mantêm uma rede.
Realimentação e Informação: Numa rede, a informação circula livremente, emitida de pontos diversos, sendo encaminhada de maneira não linear a uma infinidade de outros pontos, que também são emissores de informação. O importante nesses fluxos é a realimentação do sistema: retorno, feedback, consideração e legitimidade das fontes são essenciais para a participação colaborativa e até mesmo para avaliação de resultados e pesquisas.
Descentralização e Capilarização: Uma rede não tem centro. Ou melhor, cada ponto da rede é um centro em potencial. Uma rede pode se desdobrar em múltiplos níveis ou segmentos autônomos - "filhotes" da rede -, capazes de operar independentemente do restante da rede, de forma temporária ou permanente, conforme a demanda ou a circunstância. Sub-redes têm o mesmo "valor de rede" que a estrutura maior à qual se vinculam.
Dinamismo: Uma rede é uma estrutura plástica, dinâmica, cujo movimento ultrapassa fronteiras físicas ou geográficas. As redes são multifacetadas. Cada retrato da rede, tirado em momentos diferentes, revelará uma face nova.

Tipologia das redes
As Redes do Terceiro Setor podem apresentar uma multiplicidade de formas, muitas vezes híbridas, a partir de determinados tipos que se desdobram e modificam em graus diferenciados de multiplicação e especialização. Inicialmente, se identificam três categorias de redes no Terceiro Setor:
Redes temáticas - São aquelas que se organizam em torno de um tema, segmento ou área de atuação das entidades e indivíduos participantes. A temática abordada é o fundamento desse tipo de rede, seja ela genérica (ex.: meio ambiente, infância) ou específica (ex.: reciclagem, desnutrição infantil).
Redes regionais - As redes regionais têm em uma determinada região ou sub-região o ponto comum de aglutinação dos parceiros: um Estado, um conjunto de municípios, um bioma, uma cidade, um conjunto de bairros etc.
Redes organizacionais - São, em geral, aquelas vinculadas a uma entidade supra-institucional - isto é, que congrega instituições autônomas filiadas (federações, confederações, associações de entidades, fóruns, etc.) - ou a organizações complexas, compostas, por exemplo, de várias unidades autônomas e/ou dispersas territorialmente.

planejamento gráficoPlanejando a Rede
Segundo Bruno Ayres " Participar de uma Rede Organizacional envolve algo mais do que apenas trocar informações a respeito dos trabalhos que um grupo de organizações realiza isoladamente. Estar em rede significa realizar conjuntamente ações concretas que modificam as organizações para melhor e as ajudam a chegar mais rapidamente a seus objetivos.
Para que uma Rede Organizacional exerça todo o seu potencial é preciso que sejam criadas equipes de trabalho que atendam a alguns princípios:
Existência de um propósito unificador: É o espírito de uma rede. Pode ser expressado como um alvo unificador e um conjunto de valores compartilhado pelos participantes, de forma esclarecedora, democrática e explícita.
Participantes Independentes: Fazer parte de uma rede não quer dizer deixar de lado sua independência. Ao contrário, uma rede requer participantes independentes, automotivados, não limitados por hierarquias. Cada participante possui talentos únicos, diferentes e valiosos para trazer ao grupo e para exercer sua criatividade é preciso independência. É o equilíbrio entre a independência de cada participante e a interdependência cooperativa do grupo que dá força motriz a uma rede;
Interligações voluntárias: Os participantes da rede se relacionam e realizam tarefas de forma voluntária e automotivada, podendo escolher seus interlocutores e optar por trabalhar em projetos que os ajudem a cumprir seus objetivos pessoais e organizacionais.
Multiplicidade de líderes: Uma rede possui menos chefes e mais líderes. Líderes podem ser caracterizados como pessoas que assumem e mantém compromissos, mas que também sabem atuar como seguidores se deixar ser liderado. Como cada participante traz seus talentos à rede, estes vão ser utilizados para a resolução dos complexos problemas trazidos pelo grupo. Descentralização, independência, diversidade e fluidez de lideranças são atestados de autenticidade de uma rede que visa a transposição de fronteiras.
Interligação e transposição de fronteiras: Redes pressupõem transposição de fronteiras, sejam elas geográficas, hierárquicas, sociais ou políticas. O alcance dos objetivos e propósitos são prioridades, não importa se para isso seja necessário que o gerente delegue uma tarefa ao diretor, ou se a pessoa que melhor complementa a sua aptidão para um determinado projeto esteja trabalhando a 2000km de distância.”
5 perguntas básicas de planejamento: (As respostas dessas perguntas indicam alvo/meta; tarefa; atividades; tempo; equipe de trabalho).
  • por que? - indica necessidade motivadora, visão
  • O que? - transforma o propósito em processos de trabalho (o que tem de ser feito para alcançar as metas)
  • Como? - que atividades são necessárias para a realização das metas
  • Quando? - quadro cronológico
  • Quem? - equipes envolvidas
Animação de Redes
Podem ser criadas articulações livres e específicas (partem dos participantes) para facilitar o desenvolvimento das tarefas. Vão depender da realidade da rede.
Formação de Grupos de Trabalho para tratar de assuntos de interesse da Rede. Os Grupos de Trabalho são temáticos ou de execução de tarefas. Exemplos GT Conceitual, GT Integração e Participação, GT Captação de Recursos, GT Tecnologia, GT Mecanismos de Reconhecimento e Visibilidade, etc.
Criação dos Fóruns para encontros virtuais.
Os Fóruns são encontros periódicos, em que temas relevantes são debatidos, buscando formas de compartilhamento de experiências e solução de problemas sociais. É um espaço onde se envolve toda a rede.
Encontros presenciais
Outras articulações pontuais
A Internet tem sido um importante recurso para as redes, representando um espaço de conexão entre as organizações, otimizando a sua comunicação e as possibilidades de colaborações.
Quando as redes passam a operar também no âmbito da Internet, usufruem das facilidades que as tecnologias de comunicação e informação proporcionam websites, e-mails, chats, listas de discussão, teletrabalho, educação à distância, acesso a bancos de dados, comércio eletrônico etc.

Monitoramento e Avaliação de redes
Para o monitoramento de redes é necessário definir alguém ou um grupo que acompanhe a dinâmica da rede. Existem ferramentas apropriadas que mensuram de forma objetiva os movimentos dos participantes. Mesmo assim, é importante o diagnóstico humano, sensível às subjetividades.
É necessário notar que os participantes possuem valores e objetivos comuns, porém, dinâmicas diferenciadas de trabalho. O todo e os pontos da rede devem ser igualmente e paralelamente considerados. A complexidade organizacional de redes configura um aparente paradoxo: o todo é maior que as partes e as partes são maiores que o todo. Mas, esse paradoxo se desfaz na prática do trabalho em rede, residindo apenas no plano filosófico: as redes só existem quando suas células estão interagindo exponencialmente, em dinâmicas e lógicas não lineares. É o movimento entrecruzado e plural dos pontos que constitui e legitima a rede. Desse modo, existem indicadores para mensurar a rede em sua totalidade integradora e no âmbito de suas células. Uma avaliação deve considerar a lógica orgânica das redes: a um só tempo o todo e as partes.
Consolidar a Rede significa avançar em produção, disponibilização de informações e ampliação do espectro de atores e beneficiários reunidos através da iniciativa, para que os conhecimentos produzidos e apropriados possam ir além dos contornos institucionais já estabelecidos. A Rede ganha expressão e legitimidade na medida em que suscita o interesse dos integrantes originais e de novos atores em participar e contribuir para o seu desenvolvimento.
Haveria muitas formas de se avaliar as redes porque as avaliações sempre precisam conhecer a realidade pesquisada. No entanto, existem alguns indicadores básicos para o monitoramento de redes, conforme exemplificamos abaixo. Além disso, as informações apresentadas nos itens Fundamentos & Paradigmas e Planejamento dessa seção do site Rits podem ajudar a sua avaliação. Uma forma mais básica porém eficaz de avaliar a nós mesmos ou os nossos projetos é o chamado check list: conferência de resultados a partir de rubricas planejadas.
Participação: indica a consolidação do ambiente de rede - o reconhecimento, a utilidade e a legitimidade da rede, levando em conta as interações e a colaboração entre os atores.
Geração e troca de conteúdos: indica a intensidade da produção e da troca de informações e conhecimentos.
Interatividade e conectividade: indica se os fluxos de informação convergem para o todo e/ou suas ramificações de acordo com a intencionalidade da rede e os interesses dos integrantes.
Adesão - ampliação da rede (novos atores)
Para se chegar aos indicadores, devemos fazer perguntas, que são variáveis de acordo com a realidade estudada, mas que podem se estruturar seguindo a linha dos exemplos abaixo:
Quais são os objetivos da rede?
Que valores fundamentam a articulação?
Quando surgiu e como vem se desenvolvendo?
Como trabalha? Com que recursos? (exemplo: se organiza em Grupos de Trabalho, etc)
Como os diversos pontos se comunicam e com que periodicidade? (exemplo: utilizam tecnologias de comunicação e informação, realizam encontros periódicos, etc)
Existem pactos de convivência/padrões de relacionamento entre seus membros?
Os interesses, compromissos, atitudes e motivações visam o coletivo e a causa?

Fonte: Helena Souza e Silva Campos de Oliveira
http://www.rits.org.br/

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