sábado, 3 de abril de 2010

[PGN] Cooperar para competir


Cooperar para competir
Acordo entre concorrentes traz benefícios para as empresas envolvidas e para o consumidor

Desde que iniciamos no mundo dos negócios fomos preparados para “odiar” nossos concorrentes, para querer vê-los derrotado. Este é um sentimento muito forte e comum. Quando algum executivo é “flagrado” conversando com um concorrente, isto não é bem visto pelo pessoal da empresa. Algo muito comum neste mundo dos negócios são as aquisições. Quando um dos competidores passa a ter algum tipo de dificuldade e apresenta alguns pontos fortes que interessam ao competidor, aquele que está bem compra o outro. Outra prática que também ocorre se dá quando dois concorrentes percebem ameaças originadas de fatores externos. As mais freqüentes são a vinda de produtos importados, a entrada de concorrentes fortes ou o alto custo de produção devido à baixa escala. Nestes casos, resolvem se unir numa única empresa e defender-se das ameaças.

Acordo entre Concorrentes
O mundo corporativo está despertando para uma prática de gestão que, embora não seja nova, ainda é pouco praticada. Conhecida, dentre outros nomes, como acordos operacionais, parcerias, ou acordos para transferência de tecnologias, é realizada entre empresas que sempre se mostraram ferrenhas concorrentes.
Essa prática começou a ser mais difundida didaticamente nos exercícios de jogos de empresas, bastante freqüentes nos cursos de MBA ou cursos específicos de aperfeiçoamento de executivos. Os executivos, participantes dos jogos, começaram a observar que muitas vezes os vencedores eram as equipes que ousavam práticas pouco comuns em suas empresas, como adquirir tecnologia de uma equipe que dispunha do conhecimento desejado e, com isso, reduzir o custo do desenvolvimento e, muitas vezes o mais importante: entrar mais cedo no mercado. Muitos colegas, porém, não tinham coragem de propor outras alternativas que não fossem a forma tradicional, a saber: desenvolver, produzir, distribuir e cobrar.
Embora essa tendência tenha mudado muito, os casos práticos que fogem deste padrão ainda podem ser considerados exceções. Não é tarefa fácil produzir uma lista de 100 casos práticos.

Parcerias Possíveis
É preciso deixar claro que não se está falando aqui de acordos obscuros, como fizeram alguns donos de postos de gasolina em algumas cidades brasileiras, quando combinaram o preço final de vendas ao consumidor. Esse tipo de prática não está no contexto das parcerias a que estou me referindo; representa, sim, um crime e merece ser tratado como tal. A cooperação de que se fala aqui é aquela que ajuda as empresas envolvidas a sobreviver, a lucrar, e ainda traz vantagens ao consumidor final dos produtos ou serviços. Certamente alguns irão perguntar se isso é realmente possível. Não tenho dúvidas de que é possível, já aconteceu e está acontecendo muito próximo de nós e também mundo afora. Cito alguns exemplos bem-sucedidos que acompanhei recentemente.

Transferência de Tecnologia
A Electrolux, no Brasil, precisava lançar um refrigerador frost free (que não forma gelo). Embora já fosse uma tecnologia dominada pelo mercado, ela não era dominada pela Electrolux. Perdeu-se muito tempo tentando aprovar projetos de desenvolvimento interno da tecnologia, pois o projeto sempre esbarrava nos altos custos envolvidos e nos longos prazos necessários para o seu desenvolvimento. O problema só foi resolvido, e com muito sucesso, quando a empresa resolveu buscar um parceiro, que, num primeiro instante, era visto como um concorrente. Fechouse um acordo de transferência de tecnologia e operacional que permitiu vantagens para ambos.
O projeto foi o maior sucesso dos últimos anos na Electrolux mundial. Lançou-se um produto de altíssima qualidade em metade do tempo tradicionalmente gasto. A empresa aumentou sua participação no mercado, passando de 10%, com um produto importado, para 50% com o novo produto. Nessa parceria todos ganharam. A empresa que transferiu tecnologia ganhou, pois diluiu os altos custos de desenvolvimento e ainda vai dispor de produtos para vender no mercado, sem ter que investir milhões na construção de uma fábrica no Brasil. A Electrolux ganhou porque lançou um produto de alta qualidade, em menor tempo que o normal e por um preço menor do que o da concorrência. O consumidor brasileiro, por sua vez, ganhou e muito, pois só tinha uma opção neste segmento de mercado e era forçado a comprar o produto por altos preços, por falta de opção. Este é um caso real, recente e que está muito perto de nós. Temos mais um caso, um pouco diferente, em início de operação, envolvendo a parceria da Electrolux e uma empresa genuinamente paranaense, a Britânia. A Electrolux já tinha uma marca forte, boa rede de distribuição, uma grande equipe de vendas, mas não possuía uma linha de produtos completa no segmento de eletrodomésticos de pequeno porte. Para completar a linha de produtos, fez algumas tentativas de importar produtos das outras unidades da Electrolux espalhadas pelo mundo. Essas tentativas não foram bem-sucedidas devido à forte desvalorização cambial dos últimos anos, que tornou os produtos não competitivos no Brasil. A saída tradicional seria construir uma nova fábrica no Brasil, com altos investimentos envolvidos e um longo tempo de construção. A melhor solução, porém, estava muito próxima. A
Britânia, que tem o foco em eletrodomésticos de pequeno porte, possuía uma fábrica com alguma capacidade ociosa. Com isso, a Electrolux pôde otimizar a utilização de sua força de vendas e distribuição. A Britânia, por sua vez, pôde otimizar a utilização da fábrica, produzindo produtos com menor custo e gerando lucro. A comunidade também se beneficiou, pois mais empregos foram gerados, uma vez que agora os produtos são produzidos no Paraná, tornando-se mais competitivos que os produtos importados. Neste momento, a operação é restrita a produtos destinados ao mercado externo, especialmente a América Latina, porém poderá prosperar para uma cooperação mais intensa, abrangendo também o mercado interno. Este é mais um caso de sucesso, em que todos ganharam por cooperar para competir.

Benefícios Mútuos
Nos dois casos citados não houve compra de empresas ou fusões. Cada empresa continua operando normalmente, como antes. Apenas se beneficiam de um acordo, que tem validade até que seja bom para ambas as partes. Se em algum momento este acordo deixa de beneficiar uma delas o acordo é desfeito, respeitando-se o contrato firmado inicialmente. Acompanhando o mercado no Brasil e no mundo, poderiam ser citados casos recentes de empresas que são fortes concorrentes no mercado brasileiro e que fecharam um acordo para se tornar competitivas na exportação de seus produtos. Por exemplo, recentemente surpreendeu a opinião pública o acordo firmado entre a Sadia e a Perdigão. Tratava-se de duas empresas em muito boas condições no mercado interno, mas que tinham dificuldades de competir em nível de exportações. Recentemente fecharam um acordo em que continuam a competir no mercado brasileiro e tornam-se parceiras para exportar. Em termos mundiais, há pouco tempo a GM e a Fiat fizeram um acordo de cooperação na área de compras. As duas empresas farão as compras mais significativas em conjunto e se beneficiarão do menor custo da operação e das vantagens do ganho de escala na compra.
Cada vez mais os executivos das empresas devem deixar as práticas convencionais de administração pensar em outras formas de sobreviver neste mundo de muitas mudanças e cada vez mais competitivo.

Práticas Alternativas
Outra prática que está se tornando comum no mercado são acordos de cooperação de empresas não concorrentes, mas que têm necessidades comuns. É bastante freqüente, no momento, empresas se unirem para lançar portais de compras na internet e, assim, reduzir os custos de aquisição de matérias-primas para suas operações. Cada vez mais recebemos notícias de acordos de cooperação entre empresas que, a princípio, não se imaginava terem nada em comum. Um dos exemplos desse tipo de prática está em andamento no Brasil entre as empresas de origem de capital da Suécia. Elas estão discutindo a criação de um portal de compras, via internet, para beneficiar empresas de ramos totalmente diferentes. Nesse projeto estarão cooperando empresas de eletrodomésticos, como a Electrolux, empresas de tecnologia em energia e automação, como a ABB, empresas de comunicação e serviços de tecnologia, como a Ericsson, dentre outras. Com todo este cenário e exemplos bem-sucedidos de cooperação para competir, certamente esta será uma prática cada vez mais freqüente no ambiente empresarial. A tendência é de que cada vez mais os executivos das empresas deixem as práticas convencionais de administração e adotem outras formas para sobreviver neste contexto de mudanças e de maior competitividade. Apoiadas pelo avanço das telecomunicações e transportes, as mudanças nos ambientes empresariais, que têm sido muito rápidas nos últimos anos, tendem a ser ainda mais intensas num futuro muito próximo. Para não sermos sufocados, não podemos nos acomodar, nem mesmo na forma de pensar.

Clécio Luiz Chiamulera é engenheiro eletricista pela UFPR, MBA pela FAE/Baldwin-Wallace, Diretor Operacional Administrativo e Financeiro da Unimed Curitiba, Presidente da Associação Brasileira de Executivos de Tecnologia da Informação, Vice-Presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças, Ex-gerente Financeiro, Controladoria e Tecnologia da Informação da Electrolux do Brasil S.A., Fundador do PMI-PR (Project Management Institute).

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